‘Paleopirataria’ faz estrangeiros dominarem trabalhos sobre fósseis brasileiros, diz artigo 6cu1x

Um time internacional de pesquisadores acaba de quantificar parte do impacto do contrabando de fósseis brasileiros para o exterior. Quase 60% das publicações científicas sobre o material da bacia do Araripe – entre Ceará, Pernambuco e Piauí – são lideradas por autores estrangeiros não vinculados a instituições do Brasil. 4e3d4t

Apesar de a legislação brasileira proibir especificamente a saída do território nacional de fósseis usados como referência para a descrição de novas espécies (os chamados holótipos), 88% dos exemplares descritos por estrangeiros estão fora do Brasil.

As conclusões fazem parte de um artigo recém-publicado na revista especializada Royal Society Open Science, que analisou trabalhos acadêmicos publicados entre 1990 e 2021.

No artigo – que também investiga a situação de fósseis no México-, os cientistas indicam a presença recorrente de práticas colonialistas nas pesquisas paleontológicas, com países ricos se apropriando de material e de espécies coletadas em nações mais pobres, ignorando legislações nacionais de proteção do patrimônio e prejudicando o desenvolvimento da ciência desses locais.

Além de apresentar dados quantitativos sobre a paleopirataria, o novo trabalho detalha que instituições internacionais fazem vista grossa para o contrabando de fósseis e que grandes revistas científicas não exigem documentos que comprovem a origem lícita do material estudado.

Em alguns casos, os mesmos grupos de pesquisadores europeus são responsáveis pela exploração irregular de fósseis tanto no Brasil quanto no México.

A postura assertiva escolhida agora pelos pesquisadores brasileiros e mexicanos marca o aprofundamento da estratégia de expor publicamente os conflitos éticos e legais relacionados à exploração irregular do patrimônio fossilífero.

“Essas coisas não são novas, elas acontecem há décadas. Estamos saturados disso tudo, mas nós não conseguimos ser escutados pela comunidade científica internacional”, diz o paleontólogo Juan Cisneiros, professor da Universidade Federal do Piauí e um dos autores do artigo.

Cisneiros salienta que as poderosas instituições de pesquisa de países desenvolvidos, assim como seus cientistas, usam um vasto arsenal de retaliações para intimidar e silenciar paleontólogos brasileiros e de outros países latinoamericanos.

“São pessoas poderosas. Nós sabemos o peso de com quem estamos lidando. Eu calculei muito os riscos e sei que posso vir a sofrer consequências acadêmicas, mas é algo que alguém precisa fazer. Temos de lutar também dentro do terreno acadêmico. Vamos levar o tema para dentro dos congressos, para dentro da discussão da ciência”, afirma.

Um dos principais temores dos pesquisadores é a possibilidade de restrição de o aos fósseis do Araripe depositados em coleções do exterior. É comum que, para estudar as principais espécies da pré-história brasileira, os paleontólogos tenham de peregrinar por museus e universidades da Europa, Japão e Estados Unidos.

Além da distância geográfica e dos altos custos associados ao câmbio desfavorável para os latinoamericanos, os paleontólogos também ficam diretamente dependentes de autorizações concedidas por instituições estrangeiras.

No levantamento realizado pelos brasileiros, foram identificadas várias publicações em que pesquisadores estrangeiros detalham abertamente que os fósseis foram comprados por seus museus e instituições: algo terminantemente proibido pela legislação do Brasil.

“Isso me causou bastante desconforto. itir que um fóssil brasileiro foi comprado significa não ter o menor pudor, não ter nenhum medo de punição. É como se essa pessoa soubesse que pode ir a um país, saqueá-lo e ainda falar disso abertamente”, diz Cisneiros.

Coautora do trabalho, a professora da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) Aline Ghilardi destaca que universidades e museus estrangeiros têm poucos incentivos para fiscalizar questões éticas e legais dos fósseis.

“As instituições fazem vista grossa para a situação dos fósseis porque elas estão sendo beneficiadas. Elas conseguem mais artigos científicos em revistas de grande impacto e têm fósseis bonitos que atraem mais visitantes para museus. Ninguém quer perder o benefício. Se nós não chamarmos a atenção, nada vai mudar”, diz a paleontóloga, que defende expor publicamente as entidades.

Uma das vozes mais ativas da ciência brasileira contra o tráfico internacional de fósseis, Ghilardi foi uma das organizadoras da campanha de repatriação do dinossauro Ubirajara jubatus, que a Alemanha se recusa a devolver.

A mobilização, que ultraou as redes sociais brasileiras e chegou à imprensa internacional e a congressos científicos no exterior, é considerada um divisor de águas para o posicionamento dos cientistas.

O fóssil do exótico animal, que viveu há cerca de 110 milhões de anos na região do Araripe, foi levado ilegalmente para a Europa, onde a espécie foi descrita em um trabalho sem a participação de nenhum brasileiro.

Imediatamente após a publicação do artigo, em dezembro de 2020, pesquisadores brasileiros aram a se mobilizar nas redes sociais através da campanha #UbirajaraBelongstoBR (Ubirajara pertence ao Brasil).

A polêmica se espalhou pela comunidade internacional e acabou levando a revista Cretaceous Research a cancelar a publicação do trabalho. O periódico também anunciou uma revisão em suas diretrizes, afirmando que não iria mais aceitar fósseis com suspeita de terem sido coletados e exportados ilegalmente de seus países de origem.

Apesar da pressão, o Museu de História Natural de Karlsruhe afirmou que não irá devolver o fóssil ao Brasil. Curador da instituição, o paleontólogo Eberhard “Dino” Frey é justamente um dos autores do artigo sobre o Ubirajara jubatus.

“Muita gente criticou no início, falando que protesto de hashtag não dava em nada, mas conseguimos juntar pessoas em vários lugares do mundo e ultraar as redes sociais. A discussão [sobre colonialismo na ciência] deixou de ser sussurrada nos corredores e nos coffee breaks ou a integrar o espaço principal nos congressos”, exemplifica Ghilardi.

Uma das grandes conquistas da campanha foi a devolução voluntária ao Brasil da aranha pré-histórica Cretapalpus vittari. Batizado em homenagem a Pabllo Vittar, esse e outros 35 fósseis de foram amigavelmente devolvidos ao Brasil pela Universidade do Kansas, nos Estados Unidos, em outubro de 2021.

Embora note uma maior abertura ao tema por parte de paleontólogos estrangeiros, Ghilardi reconhece que ainda há um longo caminho a percorrer. Por isso, o grupo propõe uma série de medidas de boas práticas para instituições de pesquisa e revistas científicas.

Uma das principais sugestões é a exigência de ampla prova documental de que o material teve origem legalizada em seu país, bem como a recusa de publicações cujos fósseis tenham procedência duvidosa.

Os autores também apelam que pesquisadores e entidades internacionais se engajem em parcerias construtivas com países que fornecem os fósseis, abandonando o modelo meramente exploratório.

Segundo o levantamento, a qualidade acadêmica dos artigos produzidos a partir de fósseis obtidos irregularmente também acaba comprometida, já que muitas vezes não são incluídas informações essenciais sobre o ambiente em que o material foi coletado.

A inclusão de atravessadores, contrabandistas e colecionadores particulares na equação incentiva ainda a adulteração deliberada dos fósseis com o objetivo de aumentar o valor de venda.

Por conta da elevada quantidade de artigos assinados por estrangeiros sobre o patrimônio do Araripe, a equipe não incluiu na análise animais invertebrados e não holótipos.

“Nós mostramos só a ponta do iceberg. A dimensão do problema é seguramente muito maior”, explica Juan Cisneiros.

O objetivo do grupo é continuar explorando assuntos relacionados ao comércio irregular dos fósseis.

Do lado brasileiro, também am o artigo: Felipe Pinheiro, professor da Unipampa (Universidade Federal do Pampa), Marcos Sales, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, Renan Bantim, da Universidade Regional do Cariri e Flaviana Lima, da Universidade Federal de Pernambuco. GIULIANA MIRANDA/FOLHAPRESS

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